A pernambucana Val se mudou para São Paulo com o intuito de proporcionar melhores condições de vida para a filha, Jéssica. Anos depois, a garota lhe telefona, dizendo que quer ir para a cidade prestar vestibular. Os chefes de Val recebem a menina de braços abertos, porém o seu comportamento complica as relações na casa.
Crítica: Esqueça a Regina Casé que você via todos os domingos no Esquenta, programa que ela apresentou na Rede Globo. Tire da sua mente essa Regina um tanto popularesca, que até faz cobertura da morte de dançarino e é criticada por todos em rede nacional. Pois em Que Horas ela Volta?, Regina Casé se transforma, se revoluciona e sim, mostra que é uma grande atriz. Claro que sua história com o popular, com a periferia e com as comunidades mais carentes ajudaram a moldar sua personagem, a doméstica Val.
Anna Muylaert é quem dirige esse filme premiado em Sundance (prêmio especial do júri para Regina Casé e Camila Márdila) e no Festival de Berlim (prêmio do público) e que exalta a figura da mulher, já que as principais personagens são femininas. Por trás das câmeras a presença delas também é forte: Anna, além de dirigir, escreveu o roteiro e o filme ainda conta com uma diretora de fotografia mulher, a Barbara Alvarez e uma montadora, Karen Harley.
A chegada da filha empregada na casa dos patrões vai evidenciar diferenças sociais tão gritantes no mundo em que vivemos hoje e que, seja por inocência ou costume, fechamos os olhos e os ouvidos. Jéssica chega para também abrir os olhos da mãe, que na sua inocência e medo dos patrões é submissa de uma maneira que chega a ser comovente para o espectador. O Brasil é um país onde as diferenças sociais são gritantes. Onde até pouco tempo atrás filho de pobre não poderia sonhar em ter uma profissão que não fosse aquela do pai ou da mãe e esse preconceito velado fica claro nas falas de Bárbara quando a menina fala de sua ambição em ser arquiteta. A ascensão do que muitos chamam de “a nova classe C” mudou os rumos do país e da sociedade, mas muitas pessoas ainda preferem fechar os olhos para a realidade que está na nossa cara.
Tem um ditado que gosto muito que diz mais ou menos assim: você sabe o caráter de uma pessoa olhando a forma como ela trata quem lhe serve. Sempre achei isso uma grande verdade e em Que Horas Ela Volta? isso fica ainda mais evidente. O empregado na casa é visto como “alguém da família” desde que não ultrapasse a porta da cozinha, desde que saiba o seu lugar e que não conteste nada, nem ninguém. Esse tema já havia sido explorado no ótimo Casa Grande e também no O Som ao Redor, dois exemplares de grandes filmes nacionais que abordam o abismo social vivenciado no Brasil e que, apesar dos anos, não se diferencia muito dos tempos da casa grande e da senzala.
Uma outra abordagem interessante que o filme faz é a do papel da mulher nessa sociedade de hoje. Todas as personagens femininas são fortes e tem muito a dizer, ao contrário dos homens, parados, estacionados e com pouco conteúdo. Com o filme se faz uma reflexão sobre a voz da mulher, que hoje pode ser repercutida mundo afora. Voz essa que lhe foi negada historicamente por anos. Falando em mulheres, é impossível não elogiar a interpretação de Regina Casé. Ela é Val, ela vive essa personagem de uma maneira tão intensa e delicada que o espectador transita entre o riso e o choro em muitos momentos. (Gisele Santos, site Plano Crítico)